quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Quem tem medo do Lobo mau?

Quem tem medo do Lobo Mau?
Eu tenho.
Você não tem?
Mas deveria.
Ou será que não?


Quem tem medo do Lobo mau?
Bruno Leandro

O apelido de Chapeuzinho Vermelho veio no ensino médio. Também, o que se poderia esperar quando você namorava alguém com o apelido “Lobo”. Lobo tinha este apelido porque tinha um jeito feroz, selvagem, quase animalesco. Menos comigo. Comigo ele era doce, sensível e fazia tudo para me agradar. Ouvia cada uma de minhas palavras e vivia elogiando meu perfume. Acho que foi isso que me atraiu nele, esta mistura de selvageria e pureza, se é que as duas poderiam coexistir.
Com o tempo o apelido de Chapeuzinho Vermelho foi encurtado e passaram a me chamar de Chapeuzinho. Continuei achando o apelido ridículo, mas parei de ligar para isso.
Não demorou muito e, logo após o colégio terminar, nos casamos. Foi então que descobri a outra face de Lobo, aquela animalesca, que ele nunca me revelava. Começou a me bater, espancar, até sair sangue. Tornei-me vítima de seus caprichos e, não raro, acordava horas depois de desfalecida por suas surras. Era uma situação em que eu me permitia ser a vítima, já que não conseguia reunir as forças para dar um basta.
Nas poucas vezes em que tive alguém para reclamar, foi quando minha querida avozinha me recebeu em sua casa, onde eu me sentia como pessoa novamente. Mas eram momentos curtos e fugazes, pois eu só me permitia ir até minha avó quando o maldito não estava em casa.
Uma vez eu disse que estava grávida. Ele me acusou, dizendo que o filho não era dele. Mas como não seria, se só a ele minha vida era dedicada? Conclusão: levantou suas mãos grandes e pesadas e me espancou tanto que tive um aborto espontâneo. Levei meses para me recuperar de tal violência. Chorei de dor e de vergonha, mas acabei agradecendo por não ter tido um filho daquele monstro. Afinal, que tipo de vida uma criança nossa levaria? Compartilharia das surras da mãe ou seria violenta como o pai?
As surras e humilhações continuaram. Até o dia em que não aguentei e fugi. Meu grande erro.
Meu maior erro não foi ter fugido daquela situação, mas ter fugido para a casa de minha avó, onde ele poderia me achar com facilidade. O que aconteceu.
Não vi sua moto estacionada, escondida perto da casa, nem percebi nada de errado no interior da casa. Apenas o silêncio. Não me dei conta de que ele chegaria mais rápido do que eu a meu destino. Quando entrei, eu entendi porque tanto silêncio.
Gritei, horrorizada! Minha avó, minha querida avó estava largada no chão, em uma piscina feita do próprio sangue. Ela havia sido assassinada pelo Lobo.
Um barulho e olhei para a porta. Lá estava ele, com a faca na mão, falando palavras ininteligíveis e me dizendo que eu o havia obrigado a fazer aquilo, que a culpa era toda minha. Eu corri para longe, perto da mesa da cozinha.
Ele veio, então, enlouquecido, para cima de mim com a faca, enorme e pronta para me tirar a vida. Eu gritei. E ele comigo. Então, a lâmina penetrou a carne, entrando fundo pelo peito e rasgando o coração que pulsava forte.
Olhei-o espantada, para aqueles olhos tão grandes e aquela boca escancarada como se fosse me devorar. Ele me largou e eu escorreguei, empapada em sangue, as lágrimas fluindo em catarata. Meu corpo encharcado de sangue ficou ali, parado, ao lado do da minha querida avó, que o Lobo havia destruído antes de atacar a mim.
Ele permaneceu de pé, seu olhar de surpresa e horror olhando para mim e para todo aquele sangue. Demorou infinitos segundos para que ele percebesse que o sangue não era meu e que sua faca não havia tido a oportunidade de me alcançar. Então ele olhou para o próprio peito e viu ali outra lâmina, que eu mesma tinha escondida comigo ao pegá-la da mesa, enterrada em seu peito e drenando sua vida gota a gota de sangue. Finalmente seu cérebro pareceu entender o que havia acontecido e sua faca caiu-lhe das mãos, enquanto ele mesmo desabava ao chão.
Naquele momento, eu chorei mais ainda, em um misto de dor, desespero e certa alegria advinda do alívio de ter quebrado as amarras e dado um final diferente à história. Desta vez o Lobo não havia devorado Chapeuzinho. Desta vez o lenhador não a havia salvado. Desta vez, pelo menos desta vez, Chapeuzinho tinha matado o Lobo Mau.

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