Hoje o meu questionamento vem de uma dúvida sincera e honesta: se a universidade é feita para formar profissionais e se escrever é uma profissão, a universidade não deveria formar escritores?
Sou formado em Letras pela UERJ, onde me tornei bacharel e licenciado em Inglês, língua e literaturas. Entrei na faculdade com a intenção e aprender a escrever melhor. Não a utilizar a língua, mas pensando, de forma ingênua, que a universidade me apresentaria conteúdos para que eu pudesse me desenvolver como escritor. Aliás, até fiquei em dúvida entre Letras e Jornalismo e muitas vezes me peguei pensando se não deveria ter cursado o segundo. Quando entrei para a faculdade de Letras, tinha uma visão romântica que não se concretizou. É claro, fiz muitas análises literárias e vi como os escritores trabalham sua obra. Porém, posso dizer que o ponto de vista foi o da pesquisa, talvez da crítica, nunca o da produção.
Recentemente, houve na UERJ um evento sobre o Mercado Editorial, muito bem organizado, com a participação de convidados de todas as esferas da produção, fosse acadêmica ou não. Tivemos acesso a tradutores, produtores, editores, escritores, pesquisadores, designers, blogueiros e muitos outros profissionais ligados aos livros. Enquanto eu percebia da parte externa aos muros da universidade um incentivo à produção, não posso dizer o mesmo da universidade em si. Inclusive, fiz esse questionamento e, apesar de entender o ponto de vista expressado pelos que me responderam, discordo.
Em uma mesa sobre a reformulação do currículo da universidade, ao perguntar se havia interesse na formação do escritor, a resposta foi de que talvez a universidade não devesse interferir nisso. Foram citados os americanos, que possuem uma graduação para escrita criativa e até mesmo graduação para best-sellers (assim foi dito). No entanto, e acho esta uma visão por demais romântica, os palestrantes acham desnecessária essa graduação. Explico o motivo pelo qual não concordo.
Acredito que a visão de que a universidade não deve formar escritores é por demais romântica, de que o escritor se faz por suas inspirações. Também acredito que ela venha do fato de que poucos consideram a escrita uma profissão de verdade. Oras, praticamente qualquer escritor tem um segundo emprego, que o paga e sustenta para que possa se dedicar àquilo que ama, mas que tem que ser levado como hobby, já que não gera dividendos. É quase como ser professor no Brasil, algo que se faz “por amor”, já que não se ganha muito com isso. E é como se, ao se almejar riqueza e profissionalização, cometêssemos o pecado de achar que devemos ganhar dinheiro com isso. Vejam que não estou dizendo que essa seja a visão dos palestrantes, é a minha interpretação pela qual, de maneira abrangente, não temos escritores profissionais que não sejam autodidatas.
Você confiaria em um engenheiro autodidata? Você se consultaria com um psicólogo que aprendeu sua profissão sozinho? Você contrataria um professor que não fosse diplomado ou não estivesse estudando para isso? A resposta para todas as perguntas, possivelmente, é não. Estou com isso dizendo que um escritor que não frequentou uma universidade tem menos valor do que um que a tenha feito? Longe de mim. Até porque nós não temos essa formação aqui. No entanto, um escritor que tenha estudado possui mais ferramentas para desenvolver seu trabalho (sim, escrever é um trabalho, sinto tirar a ilusão de quem acredita que as musas entregam tudo sem que nos esforcemos) do que um que não conhece técnicas. Afinal, escrever é uma arte e arte é técnica (de onde vocês acham que surgiu a palavra artesão, afinal?). O que quero dizer com isso é simples, por que escrever não pode ser considerada uma profissão como qualquer outra? É fato que temos cursos livres, assim como temos de teatro e artesanato, mas também temos faculdades para a formação de atores e artistas plásticos. Ou seja, há uma profissionalização dessas artes.
Enfim, creio que seja a hora de deixarmos o romantismo da formação do escritor um pouco de lado, encarar essa arte como trabalho e darmos uma oportunidade para que ela entre na academia. Afinal, a escrita criativa é constituída de técnicas, que podem — e devem — ser aprendidas. Posso estar enganado? Claro, eu vivo com a perspectiva de que possa estar falando algo incorreto. Porém, acredito que, se a universidade permitir que se crie uma faculdade de escrita criativa, teremos um grande aumento de conhecimento técnico e isso, inclusive, facilitaria a vida das pessoas que ficam meses, se não anos, tentando desenvolver suas histórias e falhando por falta de técnica. Fica então meu apelo: vejamos a profissão de escritor por um prisma um pouco menos romântico e muito mais prático.
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