sexta-feira, 6 de julho de 2012

Cordão Umbilical

Quantas vezes já não ouvimos a expressão "cortar o cordão umbilical", em artigos que falavam de pais que tinham filhos muito dependentes ou de filhos que tinham pais controladores demais? O cordão umbilical é um laço tão forte entre mãe e filho que se tornou um símbolo do laço entre os dois, uma laço de certa forma eterno e inquebrável, apesar de o cordão ser cortado logo nos primeiros segundos de vida do bebê. Mas, e se não fosse?



Cordão umbilical
Bruno Leandro

Quando Mário nasceu, esqueceram de cortar seu cordão umbilical. O pai ficou muito irritado com isso e quase bateu no médico e nos enfermeiros, mas foi convencido pela mulher a não fazer isso. Ele saiu do hospital jurando que iria processar a equipe médica inteira, mas a mãe acabou não ligando muito, pois acreditava que aquele cordão a deixaria mais próxima do filho. Não deixou de ser verdade, já que mãe e bebê não se desgrudaram por um só momento nos seus primeiros anos de vida.
O pai ficou por muitos anos inconformado, exigindo que a mulher cortasse o cordão. Onde já se vira uma coisa daquelas, uma mulher ligada ao filho por um cordão umbilical? Será que ela não percebia que seriam motivo de chacotas entre seus amigos e colegas de trabalho? Será que ela não percebia que aquilo nunca daria certo? Não adiantavam os argumentos, ela sempre se recusava. Ele tentou uma ou duas vezes cortar o cordão, mas, ameaçado de divórcio, acabou aceitando aquela situação incômoda.
No início, a família, amigos e vizinhos estranharam aquela novidade bizarra. Porém, com o passar do tempo, acabaram se acostumando e acharam aquela estranha ligação entre mãe e filho como algo natural, aceitável e, até mesmo, desejável. Eles passaram a achar lindo o laço natural entre os dois.
Como conseqüência natural de sua inusitada situação, Mário era muito apegado à mãe, assim como ela a ele, e não se separavam quase nunca. Foi um berreiro a primeira vez em que ele teve que ficar na creche com as outras crianças. Sua mãe não agüentou ver seu choro e acabou deixando que Mário voltasse para casa com ela. Nesse dia, ela desistiu de trabalhar, para se dedicar apenas ao filho.
Com o passar do tempo, Mário foi crescendo e, à medida que crescia, seu cordão umbilical crescia junto. Tanto era assim que, quando o menino foi à escola pela primeira vez, sua mãe voltou para casa para cuidar de seus afazeres, deixando-o com uma professora muito espantada pelo que via. Todos os coleguinhas do pequeno Mário se assustaram com o que viram, mas logo a novidade deixou de sê-lo e todos o trataram como se o cordão não existisse.
Alguns anos mais se passaram e a mãe de Mário começou a sentir o peso da sua ligação com seu filho. Mário havia entrado na adolescência e sua rebeldia misturada com seu jeito de menino mimado criado sem limites já cobrava o preço: Mário estava cada vez mais insuportável e queria coisas absurdas a todo momento. Gritava e xingava se sua mãe não lhe desse o que queria, ofendia os mais velhos e não tinha respeito algum pelos pais. O pai teve uma conversa muito séria com a mãe e exigiu que ela cortasse aquele cordão. Ela concordou. Mário, não. Derrotados, os pais se submeteram aos caprichos do filho.
Um dia, já adulto e em suas andanças por aí, Mário conheceu uma linda moça chamada Odete. Ele tentou se aproximar, achando que era um presente dos deuses para qualquer mulher que cruzasse seu caminho, exatamente como mamãe dizia.
Quando o viu, Odete tomou um susto: como podia um homem daquele tamanho ainda ser ligado à mãe pelo cordão umbilical? Ela não reagiu às cantadas do rapaz. Muito pelo contrário, apenas riu – e muito – dele. Ofendido, Mário quis saber o porquê de todas as gargalhadas e Odete não perdeu tempo em explicar. Mário não gostou do que ouviu e foi embora, largando aquela mulher de mão. O problema é que Cupido tem um senso de humor muito estranho, às vezes. A verdade é que, sem saber, Mário havia se apaixonado por Odete naquele instante.
Demorou muito, mas muito tempo mesmo, para que Mário conseguisse conquistar Odete. Para fazê-lo, ele teve que modificar seu jeito, sua atitude e seu comportamento. Mário deixou de ser o mimado arrogante filhinho da mamãe que costumava ser e começou a se transformar em um homem. Sua mãe começou a ficar preocupada com isso.
Um dia, sem mais nem menos, Mário chegou em casa com uma tesoura: havia tomada a decisão de cortar seu cordão umbilical fora. Desesperada, a mãe simulou um ataque cardíaco e foi levada à pressas para o hospital. Arrependido, Mário desistiu de sua idéia inicial. Ia manter o cordão intacto, apesar de isso não mudar seus planos.
Mário já estava decidido: iria casar com Odete. Ele fez o pedido e ela aceitou. Casaram um mês depois, sob as bênçãos dos pais dela e do pai dele. A mãe de Mário decidiu virar sogra.
Quase toda semana, a sogra de Odete ia visitá-los. Ela trazia sempre um sorriso enorme no rosto para o filho e uma cara de desprezo ainda maior para a nora. Rondava os dois mais do que mosca varejeira em pão doce de padaria. Não desgrudava do filho e não dava espaço para a nora. Ela sufocava o ambiente familiar que os dois tentavam construir entre si. Odete foi cansando daquilo, pois Mário não conseguia reagir às investidas da mãe dele, o que tornava o relacionamento entre os dois praticamente impossível. A gota d’água foi quando, durante uma discussão entre as duas, em que Odete estava totalmente certa e sua mãe estava completamente errada, Mário ficou do lado da mãe, em vez de do da esposa. Isso provocou a separação.
Odete se mudou no mesmo dia e Mário ficou inconsolável. Sua mãe, feliz porque seu trabalho ali estava feito, foi para casa e convidou seu filho a voltar com ela. Ele se recusou, mas ela imaginou ser uma questão de tempo.
Triste, Mário ficou deprimido por uma semana, enquanto sua mãe aproveitava para estreitar cada vez mais o tamanho do laço entre eles. Uma linha de costura fazia maravilhas nessas horas. O problema é que Mário já não era mais o mesmo homem. Ele precisava tomar uma decisão.
Menos de um mês depois, com flores e chocolates, Mário bateu à porta de Odete. O coração dela deu um salto ao vê-lo, mas ela disfarçou bem. Ele não. Aliás, como todos os homens.
Mário trazia três presentes consigo: as flores e chocolates já mencionados e um presente que fez Odete dar novo salto em seu interior e um pulo de surpresa no exterior: uma tesoura. Ela não precisou pensar muito para entender o que aquele presente significava, mas recusou-o. Mário ficou desapontado, achando que ela não o queria mais, mas ele havia entendido errado. Odete não estava devolvendo a tesoura, estava dando a ele. Ele entendeu e pegou o objeto.
Sem pensar duas vezes, Mário finalmente cortou seu cordão umbilical.

2 comentários:

  1. Querido blogueiro estou criando um trabalho a ser publicado e gostaria de saber onde consegiu essa imagem da criança com o cordão umbilical. No aguardo (só leia não publique)

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    1. Miguel, eu não vi outra maneira de contatá-lo, uma vez que meus comentários são aprovados automaticamente. Vou deixar estes comentários uma semana no blog e depois excluo, se você assim quiser.
      Bem, quanto à imagem, faz mais de seis meses que a tenho, então não lembro. Possivelmente, foi de um banco de dados de imagens.

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