quarta-feira, 20 de novembro de 2019

O exotismo da raça

Ou por que os negros não são vistos como belos, apenas atraentes, quando muito


    Acredito que cada assunto que eu levante aqui tenha a ver com escrita. Claro, é antes uma maneira de posicionamento no mundo, mas também uma forma de analisá-lo na hora de produzir histórias. Os pensamentos aqui não são aleatórios ou descartáveis, mas uma maneira de produzir conteúdo que será usado para pensar em histórias futuras. Justificativa dada, vamos ao assunto de hoje:
    Qual imagem vem à sua cabeça quando se fala em uma mulher bonita? Provavelmente será uma mulher branca, talvez loira ou ruiva, olhos claros, magra e feminina. E um homem bonito? Acredito que branco, loiro ou moreno, olhos penetrantes e jeito másculo. Não se preocupe em negar ou justificar. É possível que você não tenha esse padrão de beleza para si e, caso o tenha, isso não é exatamente um problema seu, mas da sociedade. Afinal, a sociedade nos ensina a olhar apenas um tipo de beleza como padrão. O que não se encaixa é feio ou, na melhor das hipóteses, exótico.
    Beleza exótica é uma pequena desculpa que temos para dizer que tal pessoa não se encaixa no que consideramos o padrão. Aquela pessoa é bela, claro, mas, por estar fora de nossos parâmetros, ela se torna “exótica”. Isso acontece não só com negros e negras, como também a pessoas gordas, com algum tipo de cicatriz, orientais, etc. Porém, para abreviar o assunto e focar no que conheço por dentro, falarei dos negros atraentes.
    Exercer atração não é necessariamente ser bonito/a. Significa que há algo em você que faz com que outras pessoas queiram estar com você, ficar e, talvez, até namorar. Isso tudo apesar de você. Apesar de sua beleza não ser padrão e apesar de seu tom de pele.
    Já notaram que, quando se fala que uma pessoa branca é bonita, diz-se apenas “fulano/a é bonito/a”? Porém, caso a pessoa seja negra, temos que “fulano/a é um/a negro/a bonito/a”. Pode não ser a intenção de quem diz isso, mas as palavras soam como: “fulano/a é bonito/a apesar de ser negro/a”. Eu sei, parece vitimismo e perseguição, não é mesmo? Afinal, a pessoa já foi chamada de bonita, quer mais o quê? Porém, vamos analisar que você nunca sinaliza a cor de pele de uma pessoa branca? E que, no máximo, fala sobre a cor de cabelo, ao dizer “uma loira/ruiva/morena bonita”? Já se perguntou o motivo? Uma dica: tem a ver com padrões.
    Por haver um padrão, o que foge dele é exótico e sua beleza é atrelada à concessão de seu exotismo. Uma pessoa negra é vista como atraente, mas poucas vezes como bela, exceto se tem algum traço branco que lhe suavize. Narizes e lábios grossos não costumam ser sinônimo de beleza, isso é fato. Cabelos crespos? Idem. E um tom de pele escuro não costuma atrair muita simpatia. É um imã para desejos, claro. Bem sabemos o que se pensa sexualmente sobre negros, mesmo que não seja verdade. Ou que seja verdade para algumas pessoas e não para outras, como é comum no mundo em geral. Ninguém é mais ou menos lascivo e voluptuoso apenas pela quantidade de melanina em sua pele.
    Exotismo? Não. Atratividade? Não apenas. Uma pessoa negra também pode e deve ser considerada bela. É algo complicado, já que a sociedade nos conduz a não acreditar nisso. No entanto, é sempre possível se quebrar esse ciclo. Que tal começarmos agora?
    PS: Um apelo a escritores quando utilizarem personagens negros: não façam sua beleza exótica ou diga que são apenas atraentes. Se forem bonitos, digam apenas isso. Melhor ainda, descrevam a beleza de seu personagem, mas sem apelidá-la. Creio que a história ficará ainda melhor sem que se utilizem expedientes tão simplistas.

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